Em um de seus recentes artigos, Lucy Kellaway, colunista do Financial Times, cita um estudo sobre executivas do Reino Unido em que se constatou que as mulheres praticam quatro vezes mais a tal da autodepreciação, se comparadas com a prática masculina. E isso acontece tanto na vida pessoal como no âmbito profissional.
A coisa funciona mais ou menos assim: eu revelo minhas fraquezas e você expõe as suas, criando uma espécie de cumplicidade, um certo conforto em saber que todos temos limites, somos falíveis e defeituosas, todas irmãs e portanto não há o que temer. Superheróis?! Só nos quadrinhos, portanto, errar passa a ser permitido.

Desprestigiar-se. Esse jeito canhoto de conquistar simpatia e enfrentar dificuldades parece estranho em tempos de Angela Merkel no comando do governo da Alemanha, Michelle Lagarde, poderosa presidente do Fundo Monetário Internacional e Janet Yelen, a primeira presidenta do FED, banco central americano. O assunto parecia estar encerrado – autoconfiança, direitos iguais, espaço aberto na sociedade, liberdade de escolher o próprio destino, atributos até o século passado exclusivamente masculinos. Será?
Kellaway lembra que atitudes desse tipo começam cedo na convivência entre amigas, especialmente quando se trata do dilema trabalho x família. As mulheres usam esse recurso como uma cláusula de não concorrência, diz a colunista.
Mas parece que, nos últimos tempos, sob a égide do Marketing, o jogo invadiu o mundo dos negócios. É o que mostra outro estudo, desta vez assinado pela equipe da Universidade do Novo México. Os pesquisadores identificaram a autodepreciação como ferramenta para desarmar o interlocutor, criando simpatia e reduzindo o pânico que alguém mais poderoso do que a gente nos inspira.
É como se você estivesse dizendo: não tenha medo, pode se aproximar, eu também tenho lá meus defeitos. Para quem tem confiança em si e sabe de seus talentos, reconhecer uma limitação real não significa fraqueza. Mas, atenção: há de haver limites nessa troca de revelações que não deve levantar dúvida sobre a capacidade pessoal ou profissional dos envolvidos. O efeito rebote pode ser o bullying. Questões de maior envergadura devem ser discutidos apenas com um coach ou no divã do analista. Pode acontecer de o interlocutor, em vez de captar seu recado – sou uma pessoa normal – traduzir sua atitude como carência.
Nas empresas, onde, por incrível que pareça, ainda não é consenso que as mulheres são tão capazes quanto os homens, a autodepreciação pode soar como um pedido de desculpas antecipado, um temor de enfrentar desafios. Fica o recado: pense duas vezes antes de adotar essa estratégia e veja bem com quem está falando. Pelo menos até que a tal da igualdade profissional seja conquistada.